Advogado propõe regulação do Turismo de aventura

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Advogado Bruno Cação

A recente morte da brasileira Juliana Marins durante uma escalada no Monte Rinjani, na Indonésia, e o trágico acidente com balão de ar quente em Santa Catarina, que vitimou oito pessoas, acenderam um sinal de alerta para os perigos do Turismo de aventura quando praticado sem os devidos padrões de segurança.

Bruno Cação, advogado no FAS Advogados com atuação focada em práticas de Hospitalidade, Viagens e Lazer, debate como os dois episódios revelam lacunas graves na regulação, fiscalização e formalização contratual dessas atividades, expondo turistas a riscos que poderiam ser evitados com estrutura adequada e cumprimento das normas técnicas.

Leia o artigo na íntegra:

Turismo de aventura: liberdade exige regulação

“A morte da brasileira Juliana Marins durante uma escalada no Monte Rinjani, na Indonésia, e o acidente com balão de ar quente em Praia Grande (SC), que resultou em oito mortes, expuseram de forma contundente os riscos do Turismo de aventura praticado fora de padrões adequados de segurança e conformidade. O problema não está na atividade em si, que é legítima, reconhecida e promissora, mas na ausência de estrutura regulatória, fiscalização efetiva e contratos robustos que garantam a integridade de quem consome e de quem oferece essas experiências.

No caso da Indonésia, os relatos revelam uma sucessão de falhas. O Monte Rinjani é uma trilha de alta dificuldade, com histórico de acidentes fatais, que exige preparo físico específico, equipamentos adequados e atenção constante às condições climáticas. Mesmo assim, o monitoramento da atividade era precário.

O grupo contava com turistas de diferentes níveis de condicionamento e, segundo testemunhos, não havia sistemas eficazes de suporte emergencial. A brasileira caiu de uma altura de 300 metros, e o socorro foi dificultado pela própria geografia da montanha e pela ausência de meios logísticos mínimos para resposta rápida. Esse episódio escancara a importância de protocolos de segurança padronizados e da qualificação dos condutores, mesmo em destinos turísticos consagrados.

Já no Brasil, o acidente com balão de ar quente, ocorrido em Santa Catarina, mobilizou a Comissão de Segurança Pública do Senado, que passou a discutir com urgência a necessidade de regulamentar o setor. Embora a empresa estivesse formalmente licenciada, surgiram dúvidas sobre a manutenção dos equipamentos, a forma como o voo foi conduzido e os procedimentos de segurança adotados. A tragédia escancarou a fragilidade da fiscalização e evidenciou que a simples existência de um alvará ou licença não é, por si só, garantia de segurança efetiva.

Esses episódios demonstram que, sem regras claras e aderência técnica, o risco inerente a qualquer atividade de aventura deixa de ser controlado e passa a ser desmedido. O Turismo de aventura é reconhecido na Política Nacional de Turismo por meio do Decreto nº 7.381/2010, que regulamenta a Lei nº 11.771/2008, e expressamente o classifica como uma das modalidades turísticas, caracterizando-o como a prática de atividades recreativas e não competitivas com riscos controlados em ambientes naturais.

Para que esse tipo de atividade seja exercido com segurança e sustentabilidade, é indispensável que os operadores estejam em conformidade com a legislação brasileira aplicável, o que inclui o cumprimento das normas técnicas da ABNT e a formalização contratual adequada.

Essas normas incluem a ABNT NBR ISO 21101 (Sistema de Gestão da Segurança) e a ABNT NBR 15331 (Requisitos de segurança para atividades de aventura), reconhecidas como parâmetros de referência internacional. Essas diretrizes não são burocracia: são estruturas de prevenção, que reduzem a exposição ao risco e aumentam a confiança do consumidor.

Do ponto de vista jurídico, o Código de Defesa do Consumidor impõe um dever de segurança objetivo a toda a cadeia prestadora de serviços turísticos. Isso inclui agências, intermediadores, plataformas digitais, condutores e operadores finais. A responsabilidade não é afastada por contratos genéricos, cláusulas de exclusão de responsabilidade ou termos vagos de risco assumido. Pelo contrário, a ausência de contratos bem estruturados pode ampliar a responsabilização civil e administrativa em caso de acidente.

A formalização contratual no Turismo de aventura ainda é, em muitos casos, incipiente. É comum que experiências sejam vendidas com base em trocas informais de mensagens ou termos simplificados, sem detalhamento de obrigações, seguros, regras de cancelamento ou protocolos de emergência. Esse modelo não é compatível com a complexidade da atividade e expõe tanto o consumidor quanto o fornecedor.

Regular não significa engessar o setor, mas sim garantir padrões mínimos de segurança, treinamento, governança e transparência. Trata-se de proteger vidas, evitar judicializações desnecessárias e fortalecer a imagem institucional de um segmento que tem alto potencial de crescimento, especialmente no Brasil, onde a diversidade geográfica e ambiental favorece esse tipo de atividade.

A expansão do Turismo de aventura deve ser acompanhada por uma política pública coordenada, que envolva o Ministério do Turismo, Estados, municípios e entidades do setor. Iniciativas de capacitação técnica, certificação voluntária com base em normas internacionais e programas de incentivo à formalização são caminhos possíveis para avançar sem comprometer a segurança.

Os recentes acidentes são um alerta. É possível e desejável oferecer experiências radicais no Brasil e no exterior, desde que isso seja feito com responsabilidade, técnica e aderência à regulação. Sem regulação eficaz, o risco deixa de ser parte controlada da aventura e passa a ser tragédia previsível e evitável”.

Fonte: https://www.panrotas.com.br/mercado/opiniao/2025/07/advogado-alerta-para-riscos-e-propoe-regulacao-do-turismo-de-aventura-leia-o-artigo_219164.html