Nessa quinta-feira, 19, a poucos metros das marquises ao estilo art déco do Estádio do Pacaembu, na praça Charles Miller, que recebe anualmente A feira do livro, o tablado literário Motiva recebeu a editora, escritora e produtora Isabel Diegues e o arquiteto e escritor Marcelo Ferraz para uma conversa que partiu da arquitetura, mas que envolveu todo o contexto cultural brasileiro do século 20.
Ambos acabam de lançar livros cujo foco é a ítalo-brasileira Lina Bo Bardi: Isabel organizou com o arquiteto Jorn Konijn, diretor do Van Eesteren Museum de Amsterdam, o livro Lina por Aldo (Cobogó), em que vários autores refletem e analisam as afinidades estéticas e arquitetônicas entre Bardi e o colega de profissão holandês Aldo van Eyck; e Marcelo Ferraz acaba de publicar pela WMF Martins Fontes Ao lado de Lina, livro em que reúne diversos textos sobre sua experiência de trabalho que durou anos com a amiga pessoal Lina.
Nascida em 1914, Lina experienciou a realidade de uma Itália em guerra enquanto contribuia ativamente para a vida cultural do país como diretora da revista artística Domus. Segundo Isabel, essa experiência foi fundamental para a formação estética de Lina: “durante a Segunda Guerra Mundial, ela fez uma reportagem para descobrir como os italianos viviam naquela situação. Ela se deslumbrou com a forma como as pessoas conseguiam pensar em invenções a partir da precariedade. Mais tarde, quando ela conheceu o Brasil, esse deslumbramento se repetiu com a capacidade das pessoas de construir invenções e objetos belos ou não. Ela considerava que, por não ser um país industrializado, o Brasil era capaz de criar coisas completamente novas a partir dessa não formalização.”
Marcelo conta que, após uma viagem à Europa pós guerra, Lina refletiu sobre as casas reconstruídas rapidamente a partir dos escombros com o material que se tinha em mãos. “Ela dizia que refletiam a libertação de um mundo pesado e de uma casa feita para se ver e não para se habitar. Sua utopia era a fusão da casa com o homem. Ela queria forjar um futuro a partir disso. Quando chega ao Brasil, Lina vê uma possibilidade de construir esse futuro.”
Segundo Marcelo, a arquiteta nunca deixou de ser européia, mas se distanciou progressivamente e com sucesso da cultura do continente. “A briga de Lina não era só com a Europa, mas com o Ocidente. Ela tinha uma briga com Cronos, com o relógio e com a lógica capitalista do tempo produtivo. Ela criticou muito o que chamou de ‘solidão acompanhada’ em nossa sociedade. Isso é muito sofisticado para o pensamento de um arquiteto”, diz.
Para Marcelo, que vê a arquitetura de hoje como “completamente fora dos trilhos”, “a arquitetura de Lina é importante para colocar os pés dos arquitetos no chão novamente, para questionar o rumo que a arquitetura tem tomado com o pós-modernismo, que se degenerou para esse estilo internacional em que os projetos se encaixam em qualquer lugar do mundo”.
Sobre o estado atual da preservação das obras de Lina, Marcelo julga “uma ideia infeliz” o recente caso de descaracterização das janelas do projeto do prédio esportivo do Sesc Pompeia, apesar do cuidado da instituição com a obra da arquiteta: “o Sesc é muito cuidadoso, mas naquele momento houve uma ideia infeliz de um arquiteto de colocar aquela estrutura de alumínio sobre as janelas do prédio para proteger o interior de chuva. Alguém denunciou e eles resolveram retirar a estrutura.”
(function(d, s, id) {
var js, fjs = d.getElementsByTagName(s)[0];
if (d.getElementById(id)) return;
js = d.createElement(s); js.id = id;
js.src = “//connect.facebook.net/pt_BR/sdk.js#xfbml=1&version=v2.7&appId=1200972863333578”;
fjs.parentNode.insertBefore(js, fjs);
}(document, ‘script’, ‘facebook-jssdk’));
Fonte: https://revistacult.uol.com.br/home/uma-arquitetura-para-o-outro/