Ausência de Alcolumbre e Motta sinaliza disposição para confronto com STF

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O gesto dos dois – que haviam confirmado comparecimento até a manhã de hoje-, foi considerado um ato de desrespeito ao Ministro Flávio Dino

O ministro Flávio Dino comandou nesta sexta-feira uma audiência pública no STF, cuja finalidade foi debater com clareza e objetividade a prevalência das emendas parlamentares no Congresso Nacional na forma em que estão sendo praticadas.

O encontro, que contaria com a participação  de importantes interlocutores representando o poder executivo, poder legislativo e órgãos de controle, como TCU e Advocacia Geral da União, além de associações e especialistas em finanças públicas, teve, no último minuto de começar, cancelada a presença do Presidente do Senado, David Alcolumbre, e  da Câmara dos Deputados, deputado Hugo Motta.

O gesto dos dois – que haviam confirmado comparecimento até a manhã de hoje-, foi considerado um ato de desrespeito ao Ministro Flávio Dino e uma clara demonstração de que os dois dirigentes legislativos estão dispostos a endurecerem numa trajetória de enfrentamento ao Supremo Tribunal Federal.

O Ministro Flávio Dino é o relator de três ações sobre as emendas parlamentares, todas elas questionando a forma inadequada com que esse instrumento legal das emendas vem sendo utilizado nos últimos anos pela Câmara e pelo Senado, ferindo os princípios éticos e estabelecendo descaminhos numa questão inegavelmente relevante do ponto de vista social, econômico e jurídico.

As ações em análise pelo ministro Flávio Dino, que chegaram à Corte por representações do partido político PSOL, da Procuradoria Geral da União e da Abraji( Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), têm provocado descontentamento entre os dirigentes do Parlamento, que usam a retórica de que o Judiciário estaria se metendo em questões atinentes ao Legislativo, numa tentativa de que “querer legislar”, conforme têm dito em algumas oportunidades.

Para o STF, entretanto, e também para o Executivo, órgãos de controle e Advocacia, Procuradoria da União e PGU, há urgente necessidade para que a audiência de hoje se realizasse, a fim de que sejam expostos e debatidos argumentos tecnicamente qualificados e especializados, de diferentes áreas do conhecimento, que permitam ao STF avançar na discussão do mérito das ações diretas levadas à avaliação da corte.

Claramente, o objetivo era debater e concluir sobre a transparência no pagamento de emendas parlamentares a deputados federais e senadores, sobretudo as conhecidas “medidas impositivas”, que tornam o Executivo obrigado a pagar emendas sem qualquer direcionamento de aplicação, muitas vezes sem ao menos saber-se quem é o parlamentar que as destina.

Por conta dessas anomalias crescentes, sabe-se muito bem, o Congresso vem numa caminhada de descontentamento com o STF, agravada desde 2024, quando o Ministro Flávio Dino, na constatação de irregularidades graves por parte da Mesa da Câmara, proibiu ao Poder Executivo pagar emendas parlamentares arroladas em relevantes suspeitas.

De uma só vez, em 23 de Dezembro passado, o Ministro do STF determinou a  suspensão imediata do pagamento de 5.449 emendas de comissão, que juntas somavam o extraordinário valor de R$ 4,2 bilhões do orçamento da União.

E determinou que só poderiam ser liberadas, pontualmente, após Câmara e Advocacia Geral da União prestarem todas as informações esclarecedoras, capazes de afastar qualquer indício de irregularidade.

Desde então, diante da falta de esclarecimento plausível por parte da Câmara e da AGU, as partes que fizeram representação ao STF foram apresentando novos indícios de anomalias, como irregularidades na tramitação das emendas nas comissões permanentes, com suspeita de “apadrinhamento” de emendas de comissão (as conhecidas RP 8) por líderes partidários.

No final do ano passado foram apontadas, também, manipulações no Regimento da Câmara, com a suspensão das atividades de todas as comissões permanentes até 20 de dezembro, véspera do recesso parlamentar, uma manobra que teria a capacidade de inviabilizar a rediscussão de alterações feitas nas emendas com o apoio de 17 líderes partidários.

Esses fatos levaram à compreensão, no Supremo, de que ocorria um flagrante descumprimento de determinações da Corte de que os pagamentos de emendas deveriam seguir critérios de transparência e rastreabilidade.

Por conta da retenção das emendas e dos debates que se estabeleceram, Câmara e Senado têm feito um duro e nocivo enfrentamento ao Governo Lula, talvez por julgá-lo interessado ou parceiro do STF nesse represamento de dinheiro das emendas. Por conta disso, têm imposto ao governo sérios revezes, derrubando medidas governamentais necessárias ao equilíbrio fiscal e à geração de recursos que possam custear programas sociais.

Para o orçamento da União neste ano de 2025- que o Parlamento só aprovou mais de três meses depois de o ano fiscal ter sido iniciado-, deputados federais impuseram ao Executivo a alocação de R$ 50,5 bilhões para as emendas parlamentares. E nesse bolo, os repasses previstos por eles por bancadas estaduais, num ano pré-eleitoral, cresceram 67% em relação a 2024.

O que fica martelando nossa mente é saber como será em 2026. Câmara e Senado vão dar clareza às suas práticas quanto às emendas parlamentares, ou deputados e senadores, depois de tirarem o Poder do Executivo, vão fazer o mesmo com a Suprema Corte do país?