Voluntários dizem que foram coagidos pela Taurus a resgatar armas no Aeroporto de Porto Alegre

Grupo foi convencido por funcionários da Taurus que o resgate seria de crianças – Foto: Reprodução/TV Globo

Um grupo de voluntários denuncia que foi enganado e coagido a resgatar mais de 3.000 armas no Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre (RS). A operação para realizar a retirada da carga milionária do local alagado foi concluída no dia 9 de maio. O episódio foi divulgado inicialmente pelo jornal ABC e reproduzida posteriormente por diversos órgãos de imprensa.

Segundo o investidor Nicolas Vedovatto, uma dos envolvidos na trama, ele e amigos montaram uma equipe com recursos próprios para atuar nas ações de ajuda às vítimas da tragédia causada pelas fortes chuvas que castigam o RS. O grupo pratica surf e ele próprio já atuou como salva vidas. Ele relata que recebeu uma mensagem de WhatsApp de um homem que se disse coordenador das ações civis de ajuda ao Estado e que solicitou a participação do grupo no resgate de crianças ilhadas pelos temporais.

Motivados por isso, a equipe se deslocou a Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre. Na altura da BR 290, se encontraram com um grupo de pessoas desconhecidas, entre elas uma mulher que se identificou como representante da Taurus, maior fabricante de armas do país, e dona da carga.

Foi nesse momento que os voluntários perceberam que haviam caídos numa cilada. “Aí [ela] revelou pra gente que, na verdade, não se tratava de crianças, e sim, de armas. A gente ficou bem balançado. Ela nos persuadiu dizendo que o bem que faríamos para a sociedade seria mais relevante do que se nós fossemos resgatar pessoas ou animais”, conta o investidor Nicolas. “Nos enganaram, pois fomos chamados para resgatar crianças e acabamos virando escudo humano”, lamenta.

“Nos sentimos coagidos”, desabafa uma médica que pediu para não ser identificada e que também caiu no imbróglio, assim como seu namorado, que também solicitou não ter o nome revelado. “É surreal o que passamos. Ainda não caiu a ficha”, comenta o analista de sistemas Igor Garcia de Oliveira, ao lado do empresário do setor metalúrgico Isaac Freire Lopes. Liderados por Nicolas, os voluntários trabalharam na remoção das armas com um caminhoneiro e um barqueiro que eles contrataram.

Segundo o investidor, a funcionária da Taurus pediu para que guardassem os celulares durante a operação. E para “não fazermos movimentos bruscos, porque estávamos entrando na linha de tiro dos snipers [que faziam a segurança da carga]. Fizemos o percurso até [área de] carga e descarga do aeroporto. Lá, nos deparamos com vários policiais. Começamos a fazer a logística das armas”.

Nicolas acredita que os agentes da Polícia Federal os confundiram com funcionários da empresa, inicialmente. Ele também alega que após saberem que tipo de material iriam resgatar, solicitaram aos funcionários da Taurus (já no aeroporto) coletes à prova de balas, mas foi negado.

AMEAÇA DE ATAQUE

Ao UOL na tarde de hoje (17), Nicollas contou que a equipe da fabricante de armas ficou muito irritada com a chegada da reportagem do Fantástico, da Rede Globo ao local, para fazer a cobertura da operação.

Ao término do resgate, ele diz que descobriu todos os detalhes da trama. “Depois da missão concluída, foi revelado que, na verdade, tudo era uma grande mentira, que bandidos já sabiam das cargas, que o aeroporto já estava sob intenção de ataque e que a inteligência da polícia já tinha interceptado grupos de WhatsApp. Isso aí nos deixou em choque. Foi negado o uso de colete [à prova] de balas. Foi negado proteção. Eram civis no meio de uma situação… Fomos coagidos pela nossa boa intenção de salvar vidas”, concluiu”.

Ao portal, Nicollas disse ainda que houve um momento em que se sentiu na condição de sequestrado, uma vez que funcionários da Taurus no aeroporto disseram que o grupo não poderia recuar porque a operação era secreta e eles já estavam ali, envolvidos.

Em nota, a Taurus negou conhecer a participação de voluntários. Alegou que “a operação de retirada das armas no aeroporto foi coordenada na parte fluvial pelo Comando de Operações Táticas da Polícia Federal (COT) e na parte terrestre com veículo de transportadora credenciada pelo Exército Brasileiro, escoltada por dois veículos de segurança privada armados e acompanhada por três viaturas da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) da Polícia Civil do Rio Grande do Sul”

Admitiu que a recrutadora dos voluntários é funcionária da empresa, mas que ela não ocupa cargo de gestão (como se isso a eximisse a sua responsabilidade por colocar em risco a vida de civis). Vale lembrar, que além da equipe liderada por Nicollas, outras pessoas também atuaram na “missão” para agilizar o serviço, segundo o rapaz.  Ainda no comunicado, a Taurus diz que não conhece o homem que fez o primeiro contato com o grupo.

Segundo a empresa, “a conferência e manuseio das armas foram feitas por 12 funcionários da Taurus, da área de logística, devidamente capacitados. A empresa desconhece a participação de voluntários e vai levantar os fatos junto às autoridades policiais que participaram da operação”.

Também em nota, a PF explicou que “a retirada das armas que estavam depositadas no Aeroporto Internacional Salgado Filho foi coordenada pela Polícia Federal, em articulação com a Fraport, administradora do Aeroporto Internacional Salgado Filho”. E “com a empresa proprietária da carga e as pessoas contratadas por ela”, sendo esses, exclusivamente, os participantes envolvidos com a logística de remoção do armamento.

“A PF mobilizou o Comando de Operações Táticas (COT), especializado em missões de risco diferenciado, para garantir a segurança de todos os envolvidos na logística de retirada das armas”, conclui o texto.

De acordo com o portal, O COT (Comando de Operações Táticas) da PF passou a vigiar na quarta-feira (8) as imediações do aeroporto com barcos para evitar saques em geral na área, que é de responsabilidade da PF. QQ3

A carga, que seria exportada para os Estados Unidos, segundo fontes, mas negado pela Taurus, inclui mais de 3.000 armas

Além de Vedovatto, o UOL conversou com outros dois envolvidos na ação. Os três dizem que pretendem processar a empresa.

Fonte: https://horadopovo.com.br/voluntarios-dizem-que-foram-coagidos-pela-taurus-a-resgatar-armas-no-aeroporto-de-porto-alegre/