MPF considera que modelo de escolas cívico-militares de Tarcísio em SP é inconstitucional

Projeto votado em regime de urgência na Alesp sob forte repressão contra manifestantes – Foto: Reprodução

Segundo procuradores, intervenção de militares na gestão escolar “fere os parâmetros da educação nacional previsto na Constituição, cria atribuições para a força militar estadual não previstas nas normas constitucionais e afronta princípios constitucionais da liberdade de pensamento”

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal (MPF) encaminhou na última quinta-feira (6) uma representação para o procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, onde concluiu que a criação do modelo de escolas cívico-militares do estado de São Paulo é inconstitucional.

Em representação enviada ao procurador-geral da República, o subprocurador Nicolau Dino afirma que a lei complementar paulista 1.398 de 2024, que criou o modelo, fere os parâmetros da educação nacional previsto na Constituição, cria atribuições para a força militar estadual não previstas nas normas constitucionais e afronta princípios constitucionais da liberdade de pensamento, além de não permitir a gestão democrática das escolas.

“Verifica-se que houve a instituição, pelo ente federativo, de um novel modelo de escola pública para crianças e adolescentes no estado de São Paulo, denominado cívico-militar, com o indevido estabelecimento de novas diretrizes e bases para a rede de educação básica”, argumentou Dino. O subprocurador ainda ressalta que a Constituição não permite aos estados estabelecerem modelos de educação diferentes dos previstos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN).

EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS INEXISTENTES

O subprocurador também acrescentou que não há comprovação de melhoria na qualidade do ensino nas escolas cívico-militares. “Deve-se assinalar a inexistência de quaisquer evidências científicas ou estudos conclusivos que atestem a melhora no comportamento dos alunos e a qualidade do ensino”, completou.

“A Constituição Federal não permite aos estados estabelecerem modelo de educação diverso daquele definido pela LDBEN. Não está no escopo da competência legislativa concorrente dos entes federados a criação de um programa híbrido alternativo, como esse cívico-militar de São Paulo”, sustenta.

Ao estabelecer princípios e diretrizes que trazem características exclusivas do ensino militar para o âmbito da gestão educacional normatizada pela legislação federal, a lei paulista funde os modelos de educação civil e militar, o que fere a atribuição exclusiva da União para tratar do tema.

Outro problema apontado pelo procurador é a previsão de dois núcleos, um civil e outro militar composto por militares estaduais da reserva, para gerir essas escolas. Ao prever a seleção de militares da reserva para o exercício de atividades pedagógicas sem aprovação em concurso público ou formação específica, a lei afronta o princípio de valorização dos profissionais de educação, conforme aponta Dino. A Constituição Federal prevê a realização de concurso específico para a seleção de profissionais da educação básica, condição necessária ao exercício de funções pedagógicas.

DESVIO DE FUNÇÃO DE MILITARES

Além disso, a designação de militares para essas atividades configura desvio de função da força militar estadual e extrapola os limites constitucionais impostos às suas atividades. Isso porque a Constituição Federal restringe a atividade policial ao policiamento ostensivo e à preservação da ordem pública. Todos esses argumentos estão em representação encaminhada pelo PFDC ao procurador-geral da República a quem cabe analisar se é o caso de acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a constitucionalidade da Lei Complementar Estadual n° 1.398/2024.

Na semana passada, o ministro Gilmar Mendes, do STF, determinou prazo de 10 dias para o governo de São Paulo se manifestar sobre a criação do modelo de escolas cívico-militares no estado.

A decisão do ministro foi tomada após ação da bancada de oposição ao governador Tarcísio de Freitas que questiona a constitucionalidade do novo modelo de escolas. Na ação, o PSOL argumenta que a intenção do projeto é substituir o sistema público de educação, e não a coexistência dos dois modelos, como afirma o governo paulista.

“Objetiva-se a gradual substituição de profissionais da educação, os quais devem prestar concurso público e passar pela análise de seus títulos acadêmicos para estarem aptos a ocupar tais cargos, por militares, a serem escolhidos de forma discricionária, em última instância, por ato da Secretaria da Segurança Pública”, diz o partido na ação.

Veja o documento na íntegra: 

Fonte: https://horadopovo.com.br/mpf-considera-que-modelo-de-escolas-civico-militares-de-tarcisio-em-sp-e-inconstitucional/