Carlos Pereira, durante o Seminário “Nova Política Industrial a Serviço do Desenvolvimento do Brasil”. Foto: HP
A reindustrialização do país foi o motivo da unidade tão singular
No dia 11 de junho a CTB, junto com o HP, patrocinou um incomum seminário entre as confederações de trabalhadores na indústria e a Confederação Nacional da Indústria, patronal. A reindustrialização do país foi o motivo da unidade tão singular. Creio que alcançamos o consenso em três bandeiras prioritárias, que são a redução dos juros a níveis internacionais, preferência para as compras do Estado às empresas com conteúdo nacional e financiamento para empresas nacionais a juros decentes. (Veja em Trabalhadores e empresários debatem frente nacional pela reindustrialização do país).
O Brasil tem uma das maiores taxas de juros do mundo. O Estado é um grande consumidor de produtos produzidos pela indústria. O BNDES é um banco de fomento com muita liquidez. Acho que com essas medidas e, é evidente, uma boa estratégia de política industrial, o governo reindustrializa o país e cria condições de reduzir o desemprego e elevar o poder de compra do salário mínimo. Também é de igual importância o Estado dar prioridade e zerar o déficit de creches, para cuidar das crianças e liberar as mulheres ao mercado de trabalho.
Tem que revogar qualquer teto para investimento. E é bom o Haddad ficar esperto. Aliás, as decisões principais no sentido da retomada do desenvolvimento estão dentro do próprio governo: flexibilizar metas exageradas de inflação, definir políticas fiscais expansionistas ao invés de políticas restritivas, reduzir os juros dos bancos públicos, fazer a Petrobrás praticar preços de custo e não o de paridade com importação etc.
Estou seguro que, com a retomada do crescimento e uma frente ampla de trabalhadores e empresários, dando atenção e beneficiando parcerias com os deputados, o país seguirá em frente com o apoio do Poder Legislativo. Soma-se a isso um presidente com a liderança que tem o Lula, convocando o povo. Dá para ir à luta. Tais medidas favorecem a 9/10 dos brasileiros, menos os banqueiros e as multinacionais. O fato é que esse é o melhor caminho a seguir.
Se não for por este caminho, o que pode ocorrer? O fascismo e a barbárie ganham as eleições. Os fascistas são entreguistas e puxa-saco dos estrangeiros, principalmente dos EUA. E aí, sem indústria, sem emprego, é a desagregação da Pátria. Portanto, é nossa obrigação alertar a todos os brasileiros. Nós já vimos do que são capazes os fascistas. Os esgotos foram abertos. Eles estão soltos por todo lugar. Na pandemia foram 700 mil mortos, no dia 8 de janeiro barbarizaram o STF, o Congresso e o Planalto. É bom não brincar em serviço.
Tem algumas pessoas afirmando que a indústria está submetida aos bancos e ao capital estrangeiro, no sentido de que está comprometida com essa política neoliberal. Eu diria que a indústria está sufocada, independente da consciência que tenha disso. Depois dos trabalhadores, é quem mais perdeu com essa política. O chamado ‘Consenso de Washington’ e o seu tripé macroeconômico, as taxas de juros exorbitantes, o escancaramento do país aos capitais especulativos, a invasão de produtos estrangeiros, a total concentração do esforço nacional de nossa economia, dos saldos comerciais com as commodities, em fazer o superávit primário para pagamento de juro, isso é uma política anti-indústria, pró-banqueiros, pró-capital estrangeiro. Um ganha muito e o outro perde muito. É só ver o resultado de 1990 para cá.
Essa corrente de intelectuais e economistas consideram que, mesmo em segundo plano, sobra o suficiente para uma convivência pacífica entre industriais e banqueiros. Na prática o quadro é muito mais grave que mil teorias. A questão é de sobrevivência. O Brasil, nos últimos 13 anos, teve crescimento zero. Do Consenso de Washington para cá, o crescimento foi, na média, menos de 2%. Comparado com desempenho do restante do mundo, o país perdeu 63% em expansão do PIB. A taxa de investimento está em 16%, na China é 40%. A participação da indústria de transformação no PIB está em menos de 10%. São números muito ruins.
Para os trabalhadores a situação é ainda mais grave. Os 10% mais ricos concentram 51% de toda renda nacional. O salário mínimo, segundo o Dieese, é 20% do necessário para o sustento de uma família de 4 pessoas. Metade da mão de obra está na informalidade, sem direito algum. Quem está empregado, com as reformas trabalhista e da previdência, perdeu dezenas de direitos da legislação trabalhista e tem que trabalhar por pelo menos mais dez anos para se aposentar. As condições de vida são trágicas. O sistema de saúde público está depenado, nos locais de moradia as milícias disputam o domínio com o tráfico de drogas. A educação é deslocada da produção. Dois milhões de crianças não têm acesso às creches. O déficit habitacional totaliza 6 milhões de domicílios.
Os pessimistas dizem que sempre foi assim. Foi nada. Isso é ignorância. De 1930 a 1980, o Brasil foi o país que teve maior crescimento econômico no mundo, cresceu em média 7% ao ano. Na década de 1980, o PIB brasileiro era maior que o da China e da Coreia do Sul juntos. Os chineses vieram aqui para estudar a economia brasileira. Aprenderam direitinho. Naquele ano, a indústria era 30% do PIB, a taxa de investimento era de 25%. A CLT era uma das melhores legislações trabalhistas do mundo. As entidades sindicais tinham direito a arrecadação para financiar a luta.
Patrões e trabalhadores estão acostumados a brigar, mas essa hora é de unidade. O seminário foi muito positivo neste aspecto. Criou uma empatia grande entre as confederações de trabalhadores da indústria, a CTB e o Lucchesi, da CNI. Além do que, como já disse, é uma questão de sobrevivência. O Brasil precisa voltar a crescer, se desenvolver. Para isso, precisa se reindustrializar, precisa ter investimento público. O Estado tem esses recursos. Eles está sendo esterilizado na especulação financeira. Nos últimos 12 meses o governo gastou R$ 776 bilhões só com juros da dívida. O dinheiro público precisa ir para a produção e para melhorar as condições de vida do povo.
Este seminário foi muito importante para o futuro do país. Foi um primeiro contato entre a indústria e as organizações sindicais do setor para discutirem o interesse comum que é o crescimento econômico do país e foi coroado de êxito. Daí a importância do evento. Eu creio que está nascendo algo novo, com muita força, mas como tudo que é novo, precisa de muita atenção no início.
CARLOS PEREIRA
Repórter Especial do HP e Coordenador do Seminário Nacional pela reindustrialização do Brasil
Fonte: https://horadopovo.com.br/sem-industria-nao-existe-nacao/