Um conjunto de 20 cadernos grandes, de brochura e capa dura, apreendidos no escritório do operador financeiro Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, se tornou peça central na investigação da Polícia Federal sobre o megaesquema de fraudes bilionárias contra aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), informa a colunista Malu Gaspar, do jornal O GLOBO. Segundo os investigadores, os cadernos são tratados internamente como a mais relevante descoberta da primeira fase da operação e funcionam como um verdadeiro “mapa” para atingir os escalões mais altos da quadrilha.
Os cadernos, que eram preenchidos diariamente pela secretária de Antunes, contêm registros minuciosos das atividades e das finanças do operador. Segundo a PF, Antunes era o elo entre entidades de fachada e servidores públicos, sendo o responsável por intermediar e efetuar pagamentos de propinas a integrantes do INSS em troca da autorização de descontos indevidos nas aposentadorias.
Anotações feitas pela secretária trazem detalhes como datas, nomes, encontros e percentuais de pagamentos — evidências consideradas cruciais pela Polícia Federal. Em uma das páginas, aparecem indicações como “Virgilio 5%” e “Stefa 5%”, que os investigadores interpretam como referências diretas a Virgílio Oliveira Filho, procurador-geral do INSS, e Alessandro Stefanutto, ex-presidente do instituto. Ambos foram afastados de suas funções por decisão judicial na semana passada.
Segundo a PF, ex-diretores do INSS e pessoas ligadas a eles receberam mais de R$ 17 milhões em transferências feitas por intermediários do esquema. Há indícios, por exemplo, de que Virgílio teria recebido um carro de luxo avaliado em mais de R$ 500 mil. No caso de Stefanutto, apesar de ainda não haver provas materiais de pagamento de propina, os investigadores citam como justificativa para seu afastamento judicial uma série de despachos nos quais ele autorizou milhares de descontos ilegais, contrariando pareceres técnicos internos.
Os cadernos também mencionam empresas envolvidas, locais de reuniões e movimentações financeiras que, segundo os investigadores, ajudarão a aprofundar o rastreamento das conexões do grupo criminoso.
Estrutura milionária e desvio bilionário
De acordo com a Polícia Federal, o “Careca do INSS” movimentou diretamente R$ 53,5 milhões, valores oriundos de entidades sindicais e empresas ligadas às associações que fraudavam autorizações para efetuar descontos mensais nos benefícios previdenciários. Tais descontos supostamente seriam destinados a seguros ou serviços para aposentados, mas foram sistematicamente desviados. A estimativa é de que pelo menos R$ 6,3 bilhões tenham sido subtraídos de cerca de 4 milhões de aposentados desde 2019.
Patrimônio de luxo e empresas de fachada
Antunes, que nunca foi servidor do INSS, aparece como proprietário de uma frota de 12 veículos de luxo, incluindo modelos da Porsche e BMW. Ele também adquiriu, à vista, uma residência avaliada em R$ 3,3 milhões no Lago Sul, bairro nobre de Brasília, segundo a PF. Além disso, é apontado como representante legal de uma firma registrada nas Ilhas Virgens Britânicas, considerada uma possível offshore criada para blindar patrimônio obtido de forma ilícita.
No LinkedIn, Antunes se apresenta como diretor de uma empresa de consultoria na área da saúde e destaca passagens pela indústria farmacêutica e pelo setor público. “Competência, dedicação e esforço organizado fazem parte do meu dia-a-dia”, afirma o empresário, que também se identifica como ex-superintendente comercial de um plano de saúde e ex-diretor de marketing de um laboratório público.
Os investigadores destacam ainda que ele figura como sócio de várias Sociedades de Propósito Específico (SPEs) localizadas no mesmo endereço em Brasília, todas com a mesma atividade registrada: compra e venda de imóveis próprios. Para a PF, trata-se de um esquema de blindagem patrimonial envolvendo empresas de fachada.
Defesa nega envolvimento
A defesa de Antônio Carlos Camilo Antunes afirmou que ele é inocente e acredita que isso será provado ao longo do processo. “A defesa confia plenamente na apuração dos elementos constantes nos autos e na atuação das instituições do Estado Democrático de Direito. Ao longo do processo, a inocência de Antonio será devidamente comprovada”, diz nota enviada pelos advogados.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/cadernos-do-careca-do-inss-incriminam-stefanutto-e-viram-chave-para-nova-fase-da-investigacao-sobre-fraudes/