A recente formação da federação entre União Brasil e PP, assim como a fusão entre PSDB e Podemos, consolida uma tendência que vem se aprofundando na política brasileira nos últimos anos: a redução do número de partidos. De um pico de 35 legendas em funcionamento em 2015, o país deverá chegar a apenas 24 com a consolidação desses arranjos — uma queda de quase 30% em uma década. O impacto é ainda mais expressivo no Congresso: em 2019, havia 30 siglas representadas; agora, o número deve recuar para 16. As informações são da Folha de S. Paulo.
O enxugamento é reflexo direto de quatro marcos legislativos aprovados entre 2015 e 2021, que mudaram profundamente as regras do jogo para as legendas brasileiras. A primeira dessas mudanças ocorreu em 2015, quando foi aprovado um projeto para dificultar a criação de novos partidos. A partir daquele ano, para obter registro no TSE, os partidos passaram a ter dois anos para reunir mais de 500 mil assinaturas de eleitores não filiados a outras legendas — antes, não havia esse prazo nem essa restrição. A regra foi decisiva, por exemplo, para inviabilizar a criação da Aliança pelo Brasil, sigla que o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou fundar entre 2019 e 2022.
Desde então, apenas um partido foi criado com sucesso: o nanico Unidade Popular (UP), em 2019.
A cláusula de barreira e o fim das coligações
As mudanças mais estruturais, no entanto, vieram com a Emenda Constitucional 97, promulgada em 2017. A nova norma acabou com a possibilidade de coligações nas eleições proporcionais, dificultando a eleição de deputados e vereadores por partidos pequenos. Mais importante ainda, instituiu a cláusula de barreira, mecanismo que impede partidos com desempenho abaixo de determinado patamar de acessar recursos públicos e tempo de rádio e TV.
Desde 2018, a cláusula de desempenho vem sendo endurecida gradativamente. Em 2026, será exigido que as legendas obtenham pelo menos 3% dos votos válidos nacionais para deputado federal, distribuídos em no mínimo nove estados, ou elejam ao menos 15 deputados federais em pelo menos um terço das unidades da federação. Quem não alcançar esse patamar continua existindo, mas perde acesso ao fundo partidário, à propaganda e, na prática, à competitividade eleitoral.
Em 2018, 14 partidos não atingiram a cláusula. Em 2022, o número subiu para 15. Entre os que desapareceram do mapa político estão siglas como PPL, PRP, PHS, PSL, DEM, PROS, PSC, Patriota e PTB.
As federações como resposta institucional
Para contornar essas dificuldades, o Congresso aprovou em 2021 a criação das federações partidárias. O mecanismo permite que dois ou mais partidos atuem como uma só legenda por no mínimo quatro anos, compartilhando tempo de televisão, recursos e candidaturas — uma espécie de “fusão temporária”, com prazo e obrigações estatutárias.
Em 2022, três federações foram oficializadas: PSDB-Cidadania, PSOL-Rede e a mais ampla, entre PT, PCdoB e PV. Agora, a formação da federação entre União Brasil e PP avança como a principal força no Congresso Nacional, com seu lançamento simbólico ocorrido no fim de abril. A nova aliança poderá estimular partidos do centro e da direita, como MDB, Republicanos e PSD, a negociarem arranjos semelhantes.
No caso da fusão entre PSDB e Podemos, já há expectativa de que a nova legenda busque formar federação com o Solidariedade, numa tentativa de garantir musculatura eleitoral diante das novas exigências legais.
Movimento tende a continuar
Embora os acordos entre as direções nacionais estejam fechados, tanto a federação União-PP quanto a fusão PSDB-Podemos ainda precisam cumprir etapas formais, como a aprovação de novo estatuto e programa conjunto, além do aval do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Com a cláusula de barreira se tornando ainda mais exigente nas eleições de 2026 e atingindo seu ápice em 2030, a expectativa é de que novas fusões e federações ocorram, ao mesmo tempo em que partidos pequenos e nanicos desapareçam do cenário político.
A não ser que o Congresso decida rever essas regras — pleito que ressurge ciclicamente em anos não eleitorais — o Brasil tende a consolidar um sistema partidário mais enxuto, concentrado e funcional. Um cenário que muitos analistas veem como resposta necessária ao excesso de fragmentação que marcou a política nacional nas últimas décadas.
Entenda as mudanças que transformaram o sistema partidário
- 2015 – Restrições à criação de novos partidos:
Estabeleceu prazo de dois anos para coleta de 500 mil assinaturas de eleitores não filiados a outros partidos, o que praticamente estancou o surgimento de novas legendas.
- 2017 – Cláusula de barreira e fim das coligações proporcionais:
Partidos que não atingem percentual mínimo de votos perdem acesso a recursos e propaganda. Proibição das coligações dificultou eleição por partidos pequenos.
- 2021 – Criação das federações partidárias:
Permite que legendas atuem juntas como uma só por no mínimo quatro anos, compartilhando candidaturas e recursos. Vista como alternativa à fusão ou à extinção.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/fusoes-e-federacoes-reduzem-numero-de-partidos-em-30-e-aceleram-reconfiguracao-politica-no-brasil/