Ministro de Minas e Energia defende usar recursos públicos para reduzir contas de luz, em momento de baixa popularidade de Lula

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, diz que o governo enviará ao Congresso Nacional nos próximos dois meses o projeto de lei que estabelece uma reforma nas diretrizes do setor elétrico.

A ideia, segundo ele, é incluir nessa proposta o uso de recursos públicos para bancar parte dos subsídios que hoje são pagos pelos consumidores nas contas de luz. Dessa forma, seria possível reduzir as tarifas em um momento de baixa popularidade da gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Neste ano, a previsão é de que os consumidores arquem com R$ 36,5 bilhões de incentivos para usinas eólicas e solares, irrigação e redução tarifária para baixa renda. Isso representa, em média, quase 15% do total pago na conta de luz.

O objetivo de Silveira é usar recursos públicos para aliviar a fatura mensal dos consumidores — e ajudar na estratégia de retomada da popularidade do governo Lula. A proposta, porém, pode pressionar ainda o orçamento num momento em que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, busca meios para controlar os gastos públicos.

Qual a estratégia para reverter a queda na popularidade do presidente Lula?

Uma narrativa sobre o Pix tirou dez pontos (de aprovação) do governo, entrou dentro da casa das pessoas, da cabeça das pessoas, convenceu que o governo estava fazendo mal a elas. E isso colou, apesar da intenção da medida.

A inflação atinge a vida real das pessoas, quando vão ao mercado e se deparam com o preço do ovo, da carne e do café em alta. Isso também afeta a popularidade do governo…

Aí sim. Uma coisa é a narrativa, mas não podemos negar o mundo real, como esse caso dos alimentos. Precisa melhorar a condução, e estamos trabalhando.

Outro ponto que pesa na popularidade de qualquer presidente é a tarifa de energia elétrica. O ministério trabalha em alguma medida para reduzir as contas de maneira estrutural?

A tarifa de energia não pode ser tratada com uma solução artificial. Queremos apresentar um projeto para debater com o Congresso uma abertura de mercado mais ampla. No máximo, em 60 dias. Queremos abrir para os demais consumidores o mercado livre de energia (poder comprar diretamente do gerador; hoje, só grandes consumidores têm essa opção).

A tarifa é um insumo muito substancial na indústria nacional, no comércio e na atividade econômica do país. Se conseguirmos uma solução orçamentária para reduzir estruturalmente a tarifa é positivo.

O senhor defende incluir os subsídios do setor elétrico no Orçamento?

Tenho que ser realista: é impossível colocar R$ 40 bilhões da CDE (Conta de Desenvolvimento Energético, que reúne todos os subsídios do setor) no Orçamento. Mas eu acho que tem itens na CDE que nada tem a ver com o setor elétrico e poderiam ir para o Orçamento.

Quais, por exemplo?

Vai depender de uma decisão política do que entendemos de importância disso para a economia nacional. Se quisermos diminuir mais a tarifa para poder impulsionar mais os ciclos da economia, buscaremos mais recursos.

Já houve conversas com o Ministério da Fazenda sobre isso?

A equipe técnica está discutindo isso há alguns meses. Por isso, esse projeto ainda não foi encaminhado ao Congresso. A solução que é estrutural é retirar da CDE as políticas públicas que nada têm a ver com a geração de energia.

No ano passado, o senhor foi fiador da ideia de voltar com o horário de verão e isso não foi diante. Esse assunto pode ser retomado?

Eu sou a favor de ter o horário de verão toda vez que precisa. É uma medida preventiva para diminuir risco energético ou evitar aumento de tarifa por falta de planejamento. Se há uma questão hídrica que coloca os reservatórios em risco, e o horário verão vai contribuir, tem que adotar. Levamos ao limite da decisão no ano passado, mas vimos que havia começado a chover.

O horário de verão pode voltar daqui até o fim do mandato do governo Lula?

Pode, se tiver necessidade nós temos que ter coragem de fazer. No fim do período úmido (normalmente em maio), vamos vai ter uma noção da necessidade ou não. Mas estamos melhor que no ano passado. Tem havido um aumento de consumo devido às altas temperaturas e haverá mais (consumo), na minha opinião, devido a demandas advindas da inteligência artificial.

A área técnica do Ibama emitiu um parecer recomendando negar o pedido da Petrobras para explorar petróleo na Margem Equatorial, mas essa não é ainda uma decisão definitiva. Na sua opinião, o presidente do órgão, Rodrigo Agostinho, vai endossar essa negativa?

Não acredito. Eu sempre sou crítico dos extremismos. Nunca vamos achar solução no “passar a boiada” nem no eu “acredito que não pode”. É uma questão de convicção daqueles técnicos que assinaram ali. Não tem lógica não poder conhecer as nossas potencialidades. Tudo que se falar em estudo acho que o Brasil, para ter soberania, tem de fazer.

O acordo fechado entre o governo e Eletrobras sobre vagas no Conselho de Administração prevê mudanças no projeto de Angra 3. Quando o tema voltará a ser discutido no Conselho Nacional de Política Energética (CNPE)?

Meu voto foi de que não é admissível que se enterre esse custo Brasil em Angra 3. Mas também não é possível, do ponto de vista de segurança de gestão, continuar com o atual modelo de governança da Eletronuclear. É uma decisão espinhosa. Se fosse tomar uma decisão do zero hoje, ninguém faria Angra 3, mas não estamos começando do zero.

Estamos discutindo um custo de R$ 20 bilhões já afundado. Temos uma das maiores reservas de urânio do mundo, temos tecnologia para produzir combustível de Angra 1 e Angra 2, mas importamos quase 80% desse combustível. O controle tem de ser da União, mas a atividade pode ser privada.

O presidente do seu partido, o PSD, Gilberto Kassab, disse que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está enfraquecido no cargo. O que o senhor achou dessa avaliação?

Ele quis dizer que o ministro quer alguns caminhos que não têm conseguido lograr êxito. Eu não consideraria alguém fraco porque não consegue lograr êxito naquilo que entende que é melhor, mas que o presidente da República entende diferente. Isso não é ser fraco.

Se o seu partido, o PSD, decidir não apoiar a reeleição de Lula, o que o senhor fará?

Na última eleição o meu partido não apoiou e eu apoiei. O presidente tem o apoio da maioria esmagadora do PSD. Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, Bahia, Amazonas, Sergipe, Pernambuco, por exemplo, caminham com Lula.

Mas Kassab está colado no governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, apontado como possível sucessor de Bolsonaro…

É óbvio que não temos nenhuma candidatura colocada, e é óbvio que o Kassab sabe que a maioria das lideranças dos estados é Lula futebol clube. O desafio dele é convergir isso tudo em um projeto que respeite as diferenças. Tenho absoluta convicção de que o Kassab entende que o melhor para o país é o presidente Lula até 2030 e o governador Tarcísio até 2030. E, em 2030, analisamos quais são os melhores caminhos para o Brasil.

Esperava-se que Lula caminhasse para partidos de centro com a reforma ministerial. Mas quando ele coloca a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, no posto de articuladora política do Planalto, o presidente não dá passos atrás na composição com partidos da base?

Ele pôs no Palácio do Planalto alguém que ele confia, leal a ele e ao projeto e que ao mesmo tempo é experiente para poder construir política. Essa questão de colocar dois ou três a mais de partidos ditos de centro não vai alterar o quadro de composição do governo. Não é isso mais que constrói a maioria.

Como o senhor vê o PP ameaçando desembarcar do governo?

Eu não sei se o PP esteve no governo. O Brasil vive uma distorção nesse sentido. Hoje, construir um presidencialismo de coalizão talvez seja o maior desafio de um governante.

Ainda há espaço para o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), seu aliado, vir para o governo numa segunda etapa da reforma ministerial?

Isso é uma coisa que passa pelo presidente Lula, pelo presidente Pacheco, que são duas pessoas que se dão muito bem. Mas nós estamos a um ano praticamente de descompatibilização daqueles que vão disputar as eleições em 2026 (quem é ministro, por exemplo, precisa deixar o cargo para concorrer seis meses antes das eleições). Eu trabalho para que o Pacheco seja governador de Minas Gerais. Caso ele decida optar por esse caminho, já vai estar na hora de começar a conversar com as lideranças do estado e com os prefeitos.

O senhor pretende concorrer em 2026?

Eu estou focado no projeto de eleição do presidente Lula. Quero contribuir, não tenho um projeto pessoal.

Entrevista ao jornal O Globo

Fonte: https://agendadopoder.com.br/ministro-de-minas-e-energia-defende-usar-recursos-publicos-para-reduzir-contas-de-luz-em-momento-de-baixa-popularidade-de-lula/