Segundo a Quaest, 99% dos brasileiros acreditam que as enchentes do Rio Grande do Sul têm ligação com mudanças climáticas.
Metade desses brasileiros votou em Jair Bolsonaro, o homem que transformou a destruição exuberante do meio ambiente em uma espécie de profissão de fé.
A outra metade votou em Lula, que se diz a favor do meio ambiente, mas cuja prática, desde sempre, é no mínimo inconsistente. Até hoje não criou a Autoridade Climática, mantém Marina isolada, tem fixação em combustível fóssil. Seu governo não tem proposta concreta significativa para desenvolvimento sustentável na Amazônia, participação dos países ricos, aumento do consumo de etanol, estímulo aos cidadãos para terem conduta menos agressiva ao meio ambiente.
O problema não se limita aos dois últimos presidentes.
O governador tucano Eduardo Leite propôs afrouxar quase 500 exigências ambientais no Rio Grande do Sul; a proposta foi aprovada pela assembleia gaúcha em apenas 75 dias. O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), investiu exatamente zero reais em prevenção no ano passado.
O Congresso Nacional aprova um projeto contra o meio ambiente atrás do outro. O total de emendas federais para prevenção e recuperação de desastres foi de apenas 0,13% do orçamento; da bancada gaúcha, somente uma deputada destinou dinheiro para esse fim. Na semana passada, a CCJ do Senado se preparava para aprovar o afrouxamento da reserva legal na Amazônia (a votação foi adiada, mas o assunto vai voltar.)
O interesse na destruição do meio ambiente supera até a polarização política. Os senadores gaúchos Paulo Paim, petista, Hamilton Mourão e Luis Carlos Heinze, bolsonaristas, se uniram para criar um projeto em favor da exploração de carvão. (Até há quatro anos, Paim era contra esse projeto, mas, talvez inspirado pelo Doutor Fantástico de Kubrick, parou de se preocupar e passou a amar o combustível fóssil.)
Todos os políticos brasileiros foram eleitos. E 99% deles — de direita, de esquerda, de centro e do centrão — não estão nem aí para a questão ambiental. (E todos eles sofrem intenso lobby de empresários interessados em atividades econômicas lesivas ao meio ambiente.)
A catástrofe do Rio Grande do Sul é uma espécie de alerta para todos. Políticos (e empresários) têm que acordar para a realidade de que é preciso encontrar soluções para desenvolver o presente sem destruir o futuro.
E nós, eleitores, temos que acordar para a realidade de que precisamos votar melhor.
Muito melhor.
(Por Ricardo Rangel em 13/05/2024)
Fonte: https://veja.abril.com.br/coluna/ricardo-rangel/tragedia-no-sul-a-culpa-e-de-bolsonaro-e-de-lula-e-nossa/