Existem momentos na vida em que a arte não apenas imita a realidade — ela a amplifica, a reverbera pelo mundo. Foi sob essa premissa que Alice Carvalho, atriz e roteirista nascida no Rio Grande do Norte, atravessou o tapete vermelho do Festival de Cannes. E ela foi como protagonista de um ciclo que une coragem, talento e raízes firmes no chão potiguar.
Do experimental “Septo” aos holofotes internacionais com “O Agente Secreto” — longa de Kleber Mendonça Filho que emocionou Cannes com uma ovação de treze minutos —, Alice construiu um percurso onde cada escolha e cada personagem se tornaram afirmações de identidade.
Ao lado de nomes como Wagner Moura e Maria Fernanda Cândido, ela também dividiu a tela com outros artistas da terra, como Tânia Maria e Kaiony Venâncio, em um filme que chega com forte expectativa. A obra chama a atenção em um momento de efervescência do cinema nacional, impulsionado pelo sucesso de Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, que brilhou no Oscar no ano passado.
Nesta conversa, Alice fala sobre a experiência de viver esse capítulo, a potência dos afetos e o que é preciso abraçar para continuar atravessando mundos como quem sabe muito bem de onde veio.
Confira a entrevista com Alice Carvalho:
Revista Cultue – Qual foi sua primeira reação ao receber a notícia de que iria para um dos maiores festivais de cinema do mundo?
Alice Carvalho – Eu confesso que só acreditei que estava indo quando já estava quase lá (risos). É um momento muito importante na minha vida, mas mais ainda tem uma importância gigante para o cinema nacional. E fazer isso ao lado de outros dois potiguares, como Kaiony Venâncio e Tânia Maria, é inexplicável.
Cultue – Agora que o filme foi exibido em Cannes: como foi a reação do público e o feedback que te marcaram?
Alice Carvalho – O filme foi ovacionado durante 13 minutos por um público extremamente diverso, que se conectou profundamente com uma história essencialmente brasileira. Só se falava disso por lá, foi emocionante.
Cultue – O que representou, para você como atriz potiguar, estar num projeto desse porte ao lado de nomes como Wagner Moura e Maria Fernanda Cândido?
Alice Carvalho – Wagner é, além de um amigo, um grande ídolo que sempre foi farol em conduta e beleza para mim, de todas as formas. Maria também é uma figura que dispensa apresentação para toda nossa geração — e agora, também, uma colega incrível que esse projeto me deu. Foi bem emblemático atuar ao lado deles e de colegas tão importantes de outras datas, como: Buda Lira, Joálisson Cunha, Suzy Lopes, Hermilla Guedes, Gabriel Leone, Thomas Aquino, Isabel Zuaa, Italo Martins… É muito precioso como, nessa profissão, a gente tem a oportunidade de criar novos laços artísticos e reafirmar outros já existentes de maneira cíclica. E são desses encontros que me alimento pra ser uma pessoa melhor, uma artista melhor, uma potiguar melhor.
Cultue – Como foi a experiência de trabalhar com Kleber Mendonça Filho e Emilie Lesclaux?
Alice Carvalho – Eles fazem qualquer um se sentir em casa. Não teve espanto, não teve pressa, e isso está impresso também nas imagens que vocês vão ver quando esse filme chegar ao nosso país!
Cultue – Seu caminho desde ‘Septo’, passando por Cangaço Novo, até Cannes foi cheio de camadas. Como você enxerga essa trajetória hoje, o que você pode destacar?
Alice Carvalho – A presença fundamental da minha família, do Caboré Audiovisual, de Junior Dalberto, de Fátima Toledo, de pessoas que me deram tutano e tônus para seguir aprendendo, produzindo e me jogando no mundo.
Cultue – Entre as dores e delícias de ser artista, o que você levaria na mala como sua maior lição?
Alice Carvalho – Coragem para conquistar o mundo, desapego para viver “de nada” e controlar as emoções e o narciso-interno que te dá nome e sobrenome — para poder virar, dentro de uma obra e frente aos personagens, um fantasma.
O filme
Ambientado nos anos 1970, “O Agente Secreto” conta a história de um professor universitário, interpretado por Wagner Moura, que volta para Recife para reencontrar o filho caçula, apesar do risco que corre em plena ditadura militar. Segundo a BBC, a estreia nacional dele está prevista para o segundo semestre de 2025.
Wagner Moura fez história ao se tornar o primeiro brasileiro a vencer o prêmio de Melhor Ator no Festival de Cannes. Kleber Mendonça Filho levou o troféu de Melhor Direção. O Brasil já havia marcado presença em Cannes com Fernanda Torres (1986, por “Eu Sei que Vou Te Amar”) e Sandra Corveloni (2008, por “Linha de Passe”).
Vale lembrar que o aclamado “Bacurau”, também dirigido por Kleber, foi filmado em Acari e Parelhas, no interior do RN, e venceu o Prêmio do Júri em Cannes no ano de 2019.
Fonte: https://agorarn.com.br/ultimas/alice-carvalho-estreia-em-cannes-coragem/