“Abin paralela” espionou sindicalistas contrários à privatização da Eletrobrás, diz PF

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Na última semana, relatório divulgado pela Polícia Federal sobre a “Abin paralela” revelou que o esquema criado por Bolsonaro espionava líderes sindicais da Eletrobrás que se posicionaram contra o processo de privatização da empresa. Segundo a investigação, os servidores críticos à venda da estatal eram chamados de “mais vermelhos que sangue”.

Entre os alvos da ação clandestina estavam Edvaldo Risso, diretor da Eletronuclear; Pedro Brito, diretor de Furnas; e Caio Brasil Neto, também servidor de Furnas, além dos dirigentes sindicais, da Associação dos Empregados de Furnas (ASEF), Felipe Araújo, Leonardo Pessoa e Victor Costa.

A espionagem teria sido feita a pedido do ex-diretor-geral da Abin e hoje deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), considerado o principal articulador da estrutura paralela.

“O pedido foi realizado por Jair Bolsonaro para Ramagem conforme se depreende da interlocução: ‘O 01 [Ramagem] foi instado pelo 01 geral [Bolsonaro] a resolver uma questão em Furnas, pois há servidores que estão remando contra ações governamentais, em função de posicionamentos, políticos e ideológicos”, afirma a PF.

Para Felipe Araújo – também diretor de negociações do Sindicato dos Engenheiros do Rio de Janeiro (SENGE-RJ), membro do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE) e da CUT – os nomes citados pela “Abin paralela” não tinham um milionésimo da capacidade econômica e da máquina que os interessados na venda da Eletrobras tinham.

“Eles tinham a empresa e o governo na mão, e ainda a Agência Brasileira de Inteligência espionando a gente. E nós, mesmo assim, trabalhadores e trabalhadoras organizados, sob ataque constante por quase uma década, conseguimos equiparar nossa força, e quase conseguimos impedir a entrega desse patrimônio. O que nós somos capazes de fazer, enquanto trabalhadores e trabalhadoras organizadas nacionalmente, em sindicatos, não conseguimos fazer pelo nosso país?”, ressalta Felipe.

O engenheiro reforça a importância da organização sindical diante das tentativas de desmobilização e ainda de intimidação dos trabalhadores. “Os trabalhadores precisam enxergar a força da organização sindical. A gente estava numa situação de um golpe ainda que não tinha sido instituído, mas já estava acontecendo. Você imagina se continuassem no poder por mais quatro anos? O que eles não fariam? Talvez não teríamos essa conversa hoje. É uma coisa muito perturbadora. Então, é importantíssimo reafirmar a importância premente de enfrentarmos e derrotarmos essa gente que está se apropriando do poder público para poder fazer esse tipo de ação persecutória”, diz Felipe.

Segundo ele, a informação da vigilância da “Abin paralela” pegou a todos de surpresa. “É claro que a gente sabia que estava fazendo um trabalho com bastante dedicação, um trabalho militante que estava incomodando a empresa. Agora, imaginar que a gente estava a ponto de ser investigado pela Agência Brasileira de Inteligência, ainda que de forma clandestina como foi feita, aparentemente pela estrutura interna do Bolsonaro, nunca nos passou pela cabeça”, declarou.

Outro vigiado pelo esquema, Victor Costa, diretor da Associação dos Empregados de Furnas e diretor de comunicação do Sindicato dos Eletricitários do Rio de Janeiro (Sinergia-RJ) e membro da coordenação de comunicação do CNE, diz que foram pegos de surpresa pela forma nada democrática do governo Bolsonaro em lidar com a oposição a seus interesses.

“Em um estado democrático de direito é normal a gente ter opiniões diferentes. Eu posso ser contrário à privatização da Eletrobras e o governo a favor. Não tem nada demais nisso. Por isso que a espionagem nos causou grande surpresa, desapontamento e revolta”, diz Victor.

“Agora, você imagina se os casos que culminaram no ato de 8 de janeiro tivessem sido frutíferos num golpe de Estado no Brasil, como estava nos planos deles, inclusive, o de matarem o presidente da República, o vice-presidente da República e o ministro Alexandre de Moraes, segundo a imprensa. Você imagina o que iria acontecer com as pessoas que eram colocadas nessa lista da Abin?”, questionou.

“A gente não pode normalizar uma ilegalidade dentro de um Estado democrático de direito. Eu já disse isso e vou repetir sempre, é preciso ter indignação sempre que há descumprimento de lei, e num caso desse, de invasão de privacidade, é muito grave. Isso não pode ser normalizado. Então é por isso que eu digo que a gente vai fazer tudo que tiver que ser feito para que isso, que a gente tenha justiça e reparação”, completa.

Fonte: https://horadopovo.com.br/abin-paralela-espionou-sindicalistas-contrarios-a-privatizacao-da-eletrobras-diz-pf/