2.410 homicídios ocultos aconteceram no estado de São Paulo
Nesta terça-feira (18), foi divulgado o Atlas da Violência 2024, um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Entre uma série de índices e indicadores, o documento aponta para uma estabilidade no número de homicídios registrados no país em 2022, que se mantém desde 2019.
Ao todo, houve registro oficial de 46,4 mil assassinatos no Brasil durante o ano em questão, de acordo com a pesquisa. Quando considerados os homicídios estimados, que somam também registros de mortes violentas por causa indeterminada, chamados de “ocultos”, o número chega a 52,3 mil. Nesse cenário, é como se 143 pessoas tivessem sido assassinadas por dia em solo brasileiro.
O estado de São Paulo concentrou mais de 40% desses casos de homicídios ocultos no Brasil em 2022. No mesmo ano, segundo o Atlas, o Brasil registrou 5.982 homicídios ocultos e 2.410 (40,29%) aconteceram no estado de São Paulo. Os pesquisadores estimaram o número com base em registros oficiais em que o Estado não conseguiu definir a causa da morte (se decorrente de homicídio, acidente ou suicídio).
Ainda, de acordo com o levantamento, parte dessas mortes violentas por causa indeterminada são, na verdade, homicídios que ficaram ocultos nas estatísticas, fator que prejudica as análises sobre prevalência da violência letal.
O estudo é feito com base em dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), ambos do Ministério da Saúde, e diferem dos dados repassados pelas secretarias da Segurança, utilizados no Monitor da Violência e no Anuário de Segurança Pública.
Para Samira Bueno, coordenadora da pesquisa e diretora do FBSP, isso acontece, principalmente, em razão da precarização dos dados de atestado de óbito, que não estariam sendo devidamente identificados pelos médicos, levando à subnotificação de homicídios em São Paulo.
O segundo estado com mais casos do tipo é o Rio de Janeiro, com 843 registros, ou 14,09%. Em seguida, está o Ceará, com 589 ocorrências (9,85%).
Da mesma forma, de acordo com a metodologia do Atlas, o número de homicídios estimados corresponde à soma dos homicídios oficialmente registrados com os homicídios ocultos.
No caso do estado de São Paulo, a inclusão dos homicídios ocultos faz mudar significativamente a taxa de segurança pública.
Em 2022, enquanto a taxa de homicídios registrados era de 6,8 para cada 100 mil habitantes, a taxa estimada era de 12 (incluindo os ocultos). Nesse cenário, contrariando as estatísticas oficiais, São Paulo deixaria de ser o estado menos violento do Brasil, passando para a terceira posição no ranking, atrás de Santa Catarina e Distrito Federal.
INFERÊNCIAS
Segundo os pesquisadores, o que mostrou a estabilidade dos homicídios no país, foi o fato de o Brasil ter passado pela maior transição demográfica de sua história a partir dos anos 2000, rumo ao envelhecimento da população. Acrescentam ainda que, como outro fator a atuar pela queda de homicídios, cita-se o maior controle de armas de fogo a partir de 2003 com a sanção do Estatuto do Desarmamento (ED).
“Um terceiro elemento que conspirou a favor da redução de homicídios refere-se a um conjunto de políticas de segurança pública qualificadoras em alguns estados e municípios, que foram pautadas pelas evidências do que funciona e orientadas por resultados”, diz o estudo, que chama tal fenômeno de “revolução invisível”, diz o estudo.
Os estudiosos analisam, no entanto, que a partir de 2019 a velocidade na redução dos homicídios começa a perder força. “Entre 2019 e 2022, a variação da taxa de homicídio no país foi nula, tendo voltado a aumentar no Nordeste (6,1%) e no Sul (1,2%) e diminuído nas demais regiões, com destaque para a forte redução da letalidade no Centro-Oeste (-14,1%), que manteve o ritmo de queda que ocorria desde 2016”.
A pesquisa cita a política armamentista do governo de Jair Bolsonaro como uma das possíveis explicações para a estagnação dos índices a partir de 2020.
“Uma possível explicação para essa estagnação no processo de redução da violência letal no Brasil a partir de 2020 diz respeito à legislação armamentista do governo Bolsonaro, que pode ter influenciado no sentido de aumentar os homicídios, anulando a maré a favor da redução de mortes”, diz o documento.
“De fato, um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com base em metodologia econométrica robusta, mostrou evidências que, se não houvesse tal legislação, a redução dos homicídios teria sido ainda maior do que a observada entre 2019 e 2021, sendo que pelo menos 6.379 vidas teriam sido poupadas. Os autores estimaram que o aumento de 1,0% na difusão de armas de fogo gera aumento nas taxas de homicídios e de latrocínios de 1,2%”, afirmou o estudo.
“O fato é que – a menos da redução de homicídios em 2019 que ocorreu como parte de uma tendência que vinha dos anos anteriores – ao contrário do propalado, não houve qualquer sinal de melhoria na conjuntura da segurança pública no Brasil no período Bolsonaro. A tendência de queda das Mortes Violentas Intencionais se exauriu, no rastro de uma legislação armamentista negacionista. Não houve qualquer avanço institucional para a implantação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP). E, ainda, influenciado por incentivos simbólicos e pelos discursos e ações de muitas autoridades, velhos desafios voltaram à tona, como a questão da letalidade policial, como nos mostra o exemplo da Operação Verão na Baixada Santista no presente ano, que deixou 77 pessoas mortas pela Polícia Militar e reverteu a tendência de queda dessas mortes no estado de São Paulo”, concluiu as resoluções do Atlas.
Veja o estudo na íntegra:
Fonte: https://horadopovo.com.br/atlas-da-violencia-sao-paulo-concentrou-mais-de-40-dos-casos-de-homicidios-ocultos-no-brasil-em-2022/