um cacique do samba, patrimônio cultural do Brasil

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Um dos mais importantes movimentos culturais e grupo musical do país perdeu hoje seu líder, o percussionista, compositor e cantor Ubirajara Felix do Nascimento, o Bira Presidente, fundador do Fundo de Quintal e do Cacique de Ramos.

O sambista, de 88 anos, que ocupava a presidência do Bloco Cacique de Ramos desde a sua fundação, estava internado por complicações relacionadas ao câncer de próstata e ao Alzheimer, e morreu na madrugada de sábado para domingo (15), em um hospital na Zona Oeste do Rio.

O Grêmio Recreativo Cacique de Ramos surgiu em 1961, como um bloco de embalo do subúrbio carioca de mesmo nome, e Bira, ainda adolescente, já era seu líder nato.

Levou o bloco a desfilar na principal rua de Ramos, divulgando-o em programas de rádio, TV e jornais, até que em 1963, a agremiação já desfilava no Centro do Rio e já no ano seguinte emplacava um samba em disco, a composição “Água na boca” de Agildo Mendes, surgida na ala de compositores do bloco.

Com a entrada da agremiação nos desfiles na Avenida Rio Branco, começou também a rivalidade entre o Cacique e outro bloco já consolidado no universo do carnaval da Zona Norte, o Bafo da Onça. A disputa entre os dois blocos, que muitas vezes chegavam às raias do embate físico, marcaria o carnaval carioca, gerando sambas de provocação e muitas histórias.

A rixa só começou a diminuir quando, na década de 70, Bira tomou a iniciativa de procurar o presidente do Bafo da Onça, Tião Maria, para que os dois blocos unissem forças pelo carnaval.

Do Bloco Cacique de Ramos, que até hoje abrilhanta o carnaval carioca, surgiria, nos anos 70, aquele que ficou marcado como um dos mais importantes movimentos musicais do país, que abriria espaço para uma nova e promissora geração de compositores de samba, os pagodes na quadra do Cacique.

Regado a comida, bebida e futebol, revelou uma leva de talentosos sambistas e sambas inéditos, que logo extrapolaram o bairro e ganharam o Brasil na voz, primeiramente de Beth Carvalho, e depois de muitos outros artistas que passaram a frequentar a roda.

O LP “De Pé no Chão” (1978), gravado por Beth Carvalho, com produção de Rildo Hora, que trazia não apenas composições dos sambistas revelados na roda do Cacique, mas também seus instrumentistas, foi um marco na Música Brasileira. No disco, Bira toca pandeiro em todas as faixas.

Nomes como Jorge Aragão, Milton Manhães, Dida, Neoci, Tio Hélio Careca, Dedé da Portela, seguravam a onda nos primeiros anos, com Bira, Ubirany e Sereno, que mudaram a cara das rodas de samba disseminando instrumentos até então pouco comuns, como o repique de mão e o tantã, e o banjo, introduzido depois por Almir Guineto.

Já na década de 80, nomes como Arlindo Cruz, Luiz Carlos da Vila, Zeca Pagodinho, Jovelina Pérola Negra, Beto Sem Braço, Elaine Machado, Cláudio Camunguelo, Denir de Lima e Bandeira Brasil, também começaram a aparecer e divulgar seus talentos.

Dali também nasceu um dos mais importantes grupos de samba, o Fundo de Quintal, que além de fazer brilhar a nova instrumentação, com o tantã, o repique de mão e o banjo, deram voz para toda esse florescimento artístico.

Surgido a partir do grupo amador que tocava no Cacique, ainda sem nome e tendo como primeira formação – Bira (pandeiro), Ubirany (repique de mão), Sereno (tantã), Almir Guineto (banjo), Jorge Aragão (violão), Sombrinha (violão) e Neoci (tantã) -, o grupo acabou sendo convidado para participar do show “Samba é no fundo de quintal” no Teatro Opinião, e a partir daí, adotou o nome Fundo de Quintal.

Lançando o primeiro disco em 1980, o grupo deslanchou, emplacando diversos sambas na parada de sucessos e se tornando referência, pela qualidade musical e pelas boas inovações ao gênero, como uma revolução musical.

Atualmente, o Fundo de Quintal tem na formação Sereno (tantã e vocais), Ademir Batera (bateria e vocais), Júnior Itaguay (cavaquinho e vocais), Márcio Alexandre (banjo e vocais) e Tiago Testa (repique de mão e vocais). O grupo gravou 33 álbuns, entre trabalhos de estúdio e ao vivo.

Como afirma a nota divulgada pelo Cacique de Ramos sobre a morte do artista, “Bira construiu uma trajetória marcada pela firmeza, pela ética e pela contribuição inestimável ao samba e à cultura popular brasileira”.

“Sua atuação no Cacique de Ramos moldou o bloco e o samba, o Doce Refúgio se tornou um espaço de referência cultural. No Fundo de Quintal, foi o ponto de partida de uma linguagem que redefiniu a roda de samba e inspirou gerações”.

Bira deixa as filhas Karla Marcelly e Christian Kelly, os netos Yan e Brian, e a bisneta Lua.

Fonte: https://horadopovo.com.br/bira-presidente-um-cacique-do-samba-patrimonio-cultural-do-brasil/