Foto: José Luis da Conceição/OABSP
Com as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) em desrespeito à competência da Justiça do Trabalho, prevista no artigo 114 da Constituição, entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) denunciam os prejuízos que essas decisões acarretam aos direitos trabalhistas.
Para a OAB-SP, que entregará uma carta em Defesa da Justiça do Trabalho a todos os ministros do Supremo, a Corte, “a pretexto de manter sua autoridade preservada, vem caçando decisões trabalhistas que declaram vínculo de emprego, mesmo quando as provas do caso específico demonstram que a realidade dos fatos está em desacordo com o contrato firmado, sendo este nulo, portanto, nos termos da lei trabalhista”.
O documento, assinado pela OAB-SP e outras 67 entidades representativas de diferentes áreas do Direito, além de mais de duas mil pessoas da sociedade civil, manifesta que as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal, como a que estabeleceu que a Justiça comum deve analisar a alegação de fraude em contratos de prestação de serviço, têm “profundas consequências na estabilidade do mundo do trabalho, na equidade tributária, na arrecadação previdenciária e fiscal, na livre concorrência e principalmente forte impacto nos direitos sociais estabelecidos pela Constituição de 1988”.
“O artigo 114 da Constituição da República atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para julgar os conflitos decorrentes das relações de trabalho. O Supremo Tribunal Federal vem, no entanto, ao longo dos anos, impondo progressiva limitação à referida competência desse ramo do Judiciário”, diz o documento.
Segundo a Anamatra, quando a Justiça comum é acionada e analisa possível ilegalidade no contrato, só remete o processo à Justiça do Trabalho para verificar a existência do vínculo de emprego se houver fraude.
De acordo com o advogado Ricardo Carneiro, da LBS Advogados (que assessora entidades sindicais), as decisões do STF em relação a contratação via pejotização e terceirizados, interfere na competência da Justiça do Trabalho. “Por reconhecer que ali há uma relação entre duas pessoas jurídicas e que isso é uma relação cível, não uma relação de trabalho, o STF determina o envio desses processos para a Justiça Comum. O juiz da Vara Cível que julgará essa ação analisará a relação contratual ali existente e, se entender que há de fato uma fraude nessa relação, remeterá a ação à Justiça do Trabalho. Estamos aprendendo a lidar com isso, mas de fato há uma larga ingerência do Supremo Tribunal Federal nas competências constitucionais da Justiça do Trabalho, estabelecidas pelo artigo 114 da Constituição Federal”, explica.
Ele destaca que, “quando o trabalhador é contratado como pessoa jurídica, mas é exigida dele uma jornada de trabalho fixa, uma relação de subordinação, fica claro que essa relação é típica de trabalho, de emprego, pois foi constituída unicamente para fraudar a CLT”.
O advogado refere-se a um estudo da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), que reúne cerca de 3.500 juízas e juízes do Trabalho em todo o território nacional, enviado ao Supremo Tribunal Federal sobre a litigiosidade no Brasil. A conclusão é que o problema não é propriamente a alta litigiosidade, mas o grande número de processos trabalhistas pelo descumprimento da legislação trabalhista por parte dos empresários.
O advogado aponta que os argumentos do Supremo para enviar à Justiça Comum as ações dos contratos de trabalho visando diminuir a judicialização não são reais. “Há estudos que comprovam que o problema do direito do trabalho não é a grande judicialização, mas sim o extenso descumprimento do direito do trabalho pelos empregadores, que utilizam formas criativas para fraudar os direitos trabalhistas”, afirma.
Para o diretor do Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União (Sintrajufe/RS), Walter Oliveira, “a Justiça do Trabalho está sofrendo com a limitação de sua competência pelo STF. A Constituição estabelece que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações oriundas da relação de trabalho. Ora, não há dúvida de que o trabalho prestado por trabalhadores e trabalhadoras por meio das chamadas plataformas digitais deve ser tratado pela Justiça do Trabalho. É essa a arena em que os conflitos decorrentes da relação de trabalho devem ser solucionados. O STF, ao remeter à Justiça comum os processos que tratam dos conflitos de trabalhadores por meio das plataformas digitais, nega a sua condição de guardião da Constituição e facilita sobremaneira a debilitação da Justiça do Trabalho como Justiça social e de reconhecimento dos direitos dos trabalhadores”.
Fonte: https://horadopovo.com.br/oab-sp-levara-ao-stf-manifesto-cobrando-respeito-as-decisoes-da-justica-do-trabalho/