Tarcísio conclui privatização da Sabesp e coloca saneamento de São Paulo a serviço do lucro

Governador de São Paulo comemorou entrega das ações da Sabesp para o mercado – Foto: Reprodução/G1

Considerada a pior empresa de energia do país, Equatorial Energia assumirá o controle da Sabesp e planeja demissões em massa para ampliar o pagamento de dividendos aos acionistas

O governo de São Paulo concluiu nesta segunda-feira (22) a última etapa do processo de privatização da Sabesp. O controle da maior e mais importante empresa de saneamento do Brasil passará às mãos da pior empresa de energia do país, a Equatorial Energia.

A oferta pública de ações da companhia foi realizada na Bolsa de Valores de SP (B3) com perda de pelo menos R$ 4,5 bilhões aos cofres estaduais. O valor é quase um terço dos R$ 14,8 bilhões obtidos com a privatização. 

Antes da venda, o governo de São Paulo detinha 50,5% das ações da Sabesp; agora passará a ter apenas 18%. Os 32% restantes foram vendidos de duas formas. A Equatorial Energia comprou 15% das ações oferecendo os R$ 67 por cada uma delas. Outros 17% em ações da companhia foram vendidos de forma pulverizada a outros investidores. Não foi divulgado ainda quem são os principais compradores dos papéis: bancos, fundos de investimentos ou estrangeiros, por exemplo.

O valor pelo qual as ações da companhia de água e esgoto foram vendidas na privatização, ocorrida no final de 2023 – e a cotação na B3 foram, são os parâmetros usados para se chegar a esse número. Na privatização, as ações da Sabesp foram vendidas a R$ 67 cada uma. Hoje, essa mesma ação vale R$ 87.

Para o especialista em saneamento e recursos hídricos e conselheiro do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (Ondas) Amauri Pollachi, a disparidade de preço gerou uma situação irracional. Nela, o Governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) vende a ação num dia e permite ao comprador revendê-la, nesse mesmo dia, a um lucro de 30%. “São quase R$ 5 bilhões que o estado poderia ter embolsado se tivesse vendido as ações pela cotação atual”, aponta Amauri ao Brasil de Fato.

A perda, estima o especialista, pode ser inda maior se considerado o valor potencial das ações da Sabesp hoje. Cada ação da companhia vale R$ 103,90. Com base nesse preço, o governo paulista renunciou a cerca de R$ 8 bilhões ao vendê-las por R$ 67. A análise faz parte de um estudo do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema) encaminhado ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP).

O sindicato aponta que a Sabesp, sob gestão privada, terá de investir menos do que o governo de São Paulo previu para atender a interesses da privatização. Com menos investimento, a empresa lucrará mais e antes do estimado. Portanto, tende a recompensar mais seus acionistas e, por isso, teria uma ação mais valiosa.

Estudantes e trabalhadores realizaram caminhada na Avenida Paulista – Foto: Divulgação/UMES

PROCESSO SUSPEITO

A Equatorial Energia é considerada a pior distribuidora de energia do Brasil, por levantamento realizado pela Aneel e foi a única a apresentar interesse pela maior empresa de saneamento da América Latina. Com isso, lhe foi assegurado o controle da companhia, em um processo bastante controverso, que envolveu, inclusive, reunião secreta, conforme denunciou o conselheiro do Ondas, em entrevista recente ao HP.

“O processo em si foi bastante suspeito porque, as empresas foram desistindo, a coisa foi afunilando de tal forma que só restou a Equatorial, [até] porque as condições do processo também foram sempre restringidas a cada passo”, denunciou Amauri Pollachi.

“E o pior, o preço de referência por ação, que é o referencial de venda definido pelo Estado, não foi divulgado”, destacou. “Foi divulgado”, ressalva, “numa reunião do Conselho de Desestatização do Estado, [quando] foi definido isso e muitas pessoas que estavam presentes nessa reunião têm interesse com a própria Equatorial”, disse na ocasião.

Além disso, questionou o especialista, “quem garante que esse preço, que foi definido na reunião, digamos secreta, mantida sob sigilo, quem garante que esse preço não chegou a quem iria oferecer oferta?”. “Então é um processo muito, mas muito cheio de incertezas, de ilegalidades e diria assim, de talvez um grande favorecimento a um único competidor”, avaliou Amauri, que também é diretor da APU (Associação de Profissionais Universitários da Sabesp).

A Sabesp terá um conselho gestor composto por nove pessoas após a privatização. A Equatorial vai indicar três nomes, incluindo o presidente. O governo de São Paulo também indicará três membros do colegiado, assim como os outros acionistas da empresa.

Com a privatização, a meta é atender 99% da população com água potável, e pelo menos 90% com coleta e tratamento de esgoto até 2029, segundo os privatistas durante o processo de venda da estatal. Essas metas também cobririam as áreas rurais e os núcleos urbanos informais, como favelas e palafitas, dizem.

Foto: Reprodução/Alesp

DEMISSÕES EM MASSA

Para garantir o lucro aos seus acionistas, a Equatorial pretende implementar uma série de estratégias para cortar custos, sem nem ao menos estudar quais são as necessidades da companhia e dos usuários, a população paulistana.

Entre as medidas propostas pela Equatorial, destacam-se a renegociação de relações sindicais, a otimização de benefícios e a implantação de políticas de remuneração com “cultura de dono”, ou seja, alinhando incentivos por performance dos funcionários, o que obviamente, não existe hoje.

A empresa – que não tem nenhuma expertise em saneamento básico e coleciona maus resultados por onde passa, como por exemplo no setor elétrico, onde recebeu o título de pior prestadora de serviço em levantamento feito pela ANEEL – pretende reestruturar a equipe da Sabesp, propondo programas de demissão voluntária. A Equatorial inclui entre seus acionistas empresas como Opportunity e Blackrock.

Fonte: https://horadopovo.com.br/tarcisio-conclui-privatizacao-da-sabesp-e-coloca-saneamento-de-sao-paulo-a-servico-do-lucro/