Foto: Divulgação/Reprodução –
Vê-se, nessa disputa, que os governantes só apanham, com retrocesso sobre a intenção de elevar o imposto sobre operações financeiras para aqueles que mais ganham
Temos acompanhado no nosso dia-a-dia brasileiro um embate interminável e crescente entre o Governo, parlamentares das duas Casas do Congresso e setores do mega-empresariado nacional, em torno da tributação do IOF e de outro tema essencial, que trata da isenção do Imposto de Renda para trabalhadores que percebam até R$ 5 mil mensais.
Vê-se, nessa disputa, que os governantes só apanham, com retrocesso sobre a intenção de elevar o imposto sobre operações financeiras para aqueles que mais ganham e, do mesmo modo, para taxar as superfortunas na medida necessária a garantir a isenção do IR.
Desigualdades
Ninguém sai em socorro dos que sofrem as gritantes desigualdades econômicas que infelicitam grandes massas da população brasileira, mas se observa que cada vez mais ganha vigor o discurso dos que apenas dizem “não” a qualquer tipo de maior tributação, assumindo as dores de uma mínima camada da sociedade que armazena quase toda a fortuna nacional.
Lado
No meio dessa disputa da qual se sabe apenas de que lado o Legislativo- a quem cabe aprovar as propostas de lei-, ficará mais uma vez, sempre abraçado ao lobby dos que não aceitam ver suas fortunas tocadas, pois é isso que se observa em arrastadas discussões que tomam os espaços da mídia desde o ano passado.
No meio dessa cansativa disputa, enfim, deparei-me com um discurso demolidor, desses de fazer calar a boca de muito sabidão, de analistas de plantão do mercado financeiro.
Rico no Imposto de Renda
Refiro-me à fala do Presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), Dão Real dos Santos, diante de um auditório qualificado e atento, começando pela metáfora bíblica de que “é mais fácil passar um camelo no buraco de uma agulha do que um rico entrar no imposto de renda.”
Ele diz, com toda sua experiência: ” É tão difícil colocar o rico no imposto de renda que vocês nem imaginam”. E na sequência o presidente do Sindifisco fala de desigualdades, que para ele tem muitas faces, muitas cores, ” mas a desigualdade econômica parece ser aquela produtora das demais desigualdades em grande medida, geradora de todas as demais.”
Dão Real faz uma retrospectiva sobre as questões das desigualdades, remontando a 16 milhões de anos, quando a terra nem existia, não existia o humano, nem os animais, para cravar que no Brasil, um assalariado, de salário mínimo, que reservasse R$ 1 mil a cada mês para poupar, levaria exatos 16 milhões e 300 mil anos, para se transformar num daqueles mais ricos que a estreita camada dos afortunados preserva no país.
Ele lembra que a Constituição de 1988, pela primeira vez na história do Brasil, criou as bases para a gente construir um estado de bem-estar social, sendo ali que foi desenhado o conjunto dos direitos sociais.
Direitos
O artigo 6º da Constituição diz que a alimentação é um direito. Portanto, se alguém passa fome, a Constituição não está sendo cumprida. “A fome”, portanto, é inconstitucional.
Para ele, o estado de bem-estar social previsto pela Constituição de 88 surgiu tardiamente, pois no ano seguinte, em 1989, todos os Estados de Bem-Estar Social do mundo passaram a ser duramente atacados pelo neoliberalismo. E no Brasil veio da mesma forma.
O principal instrumento que estava lá na Constituição de 88 para avançar na implantação do Estado de Bem-Estar Social, era o instrumento tributário. Era preciso fazer com que a tributação, pelo menos a partir da Constituição, se tornasse uma tributação progressiva, onde os mais ricos passassem a pagar impostos ou mais impostos e os mais pobres pudessem pagar menos. E que a carga tributária pudesse crescer até o ponto de que todos os direitos constitucionais fossem cumpridos.
Quem tem o controle
E arremata: “Mas nós não controlamos o instrumento. O instrumento ficou nas mãos daqueles que não querem o estado de bem-estar social, tanto que , em 1989, um ano depois, o Imposto de Renda da Pessoa Física, que é o melhor instrumento para a distribuição de renda, que tinha sete alíquotas em 88, e a alíquota máxima era de 45%, foi reduzido a apenas duas alíquotas, com a máxima de 25%.
E conclui: ” O setor mais rico, o mais poderoso, tratou de sair logo do polo financiador do Estado. E não contentes com isso, fizeram a mais ampla reforma tributária que o Brasil viu na década de 90, isentando lucros e dividendos, o que significa uma perda de R$ 1 trilhão por ano, que são distribuídos para acionistas, sócios de grandes empresas e não pagam um único centavo de imposto.