Fachin chama moderação de conteúdo de ‘péssima’ e defende Marco Civil

O Supremo Tribunal Federal formou maioria nesta terça-feira (25) para alterar o artigo 19 do Marco Civil da Internet, dispositivo que define como as plataformas digitais podem ser responsabilizadas por conteúdos publicados por terceiros. Com oito votos favoráveis à mudança, apenas os ministros Edson Fachin e André Mendonça defenderam a manutenção da legislação atual.

O placar de 8 a 2 marca uma guinada na regulamentação da internet brasileira. Segundo a maioria dos ministros, o artigo 19 não oferece proteção suficiente aos usuários e precisa ser reformulado para tornar as plataformas mais proativas na remoção de conteúdos considerados criminosos.

Falta apenas o voto do ministro Kassio Nunes Marques, que participa da sessão remotamente, mas a maioria já está consolidada para a mudança na legislação que vigora desde 2014.

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Fachin na contramão: “péssima experiência” com moderação

O ministro Edson Fachin adotou posição isolada ao votar pela constitucionalidade do artigo 19. Durante sua manifestação, fez uma avaliação dura das tentativas anteriores de controle de conteúdo no país: “É péssima a experiência que esse país teve com a moderação de conteúdos em meio de comunicação.”

Fachin argumentou que a Lei Geral de Proteção de Dados já oferece instrumentos adequados para combater ilícitos nas redes sociais, dispensando mudanças no Marco Civil. O ministro também manifestou preocupação com possíveis excessos: “Se há obrigação de todos para combater o conteúdo ilícito, então corremos o risco de ver temerárias ações de investigação atingirem jornalistas e professores.”

Sua posição diverge tanto da maioria quanto de André Mendonça, que defende a inconstitucionalidade da remoção de perfis nas redes sociais. Fachin manteve-se numa posição intermediária, reconhecendo apenas a constitucionalidade do artigo 19 sem avançar em outras questões.

Quatro correntes dividem o tribunal

A discussão no STF revelou pelo menos quatro abordagens distintas sobre como regular as plataformas digitais:

Eliminação da ordem judicial: Os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux consideram inconstitucional a exigência de notificação judicial prévia para remoção de conteúdos ofensivos. Defendem que as plataformas devem agir preventivamente, sem necessidade de determinação judicial.

Inconstitucionalidade parcial: O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, entende que a norma é apenas parcialmente inconstitucional, sugerindo ajustes pontuais na legislação atual.

Equiparação com mídia tradicional: Alexandre de Moraes propõe igualar a responsabilidade das redes sociais aos veículos de comunicação convencionais. “Devem ser legalmente equiparados aos demais meios de comunicação”, afirmou o ministro.

Insuficiência da proteção atual: Flávio Dino, Gilmar Mendes e Cristiano Zanin consideram o artigo 19 insuficiente para proteger os usuários, defendendo maior responsabilização das plataformas na remoção proativa de conteúdos criminosos.

O que muda na prática

O artigo 19 do Marco Civil estabelece que provedores de aplicação só podem ser responsabilizados por conteúdos gerados por terceiros se não cumprirem ordem judicial específica para remoção do material considerado ilícito. Pela regra atual, as plataformas só são punidas quando descumprem determinações judiciais.

A mudança dessa regra pode impactar significativamente o funcionamento das redes sociais no Brasil. As plataformas terão que desenvolver sistemas mais rígidos de moderação e podem ser obrigadas a remover conteúdos de forma preventiva, mesmo sem ordem judicial.

Empresas como Meta (Facebook, Instagram, WhatsApp), Google (YouTube), X (antigo Twitter) e TikTok precisarão adaptar suas políticas de moderação às novas exigências que surgirem da decisão do STF.

Próximos passos da regulamentação

Com a maioria formada, os ministros ainda precisam definir os detalhes técnicos da nova regulamentação. Questões em aberto incluem:

  • Em quais situações específicas as plataformas deverão agir preventivamente;
  • Para quais tipos de crimes haverá obrigação de remoção automática;
  • Qual será o prazo para as empresas se adequarem às novas regras;
  • Como funcionará a fiscalização do cumprimento das novas obrigações.

O STF também deverá estabelecer critérios para diferenciar tipos de plataformas e serviços, já que a decisão pode afetar desde grandes redes sociais até aplicativos de mensagem e sites de menor porte.

Impacto na regulamentação global

A decisão do STF coloca o Brasil numa posição particular no cenário internacional de regulamentação de plataformas digitais. Enquanto países europeus avançam com o Digital Services Act e os Estados Unidos mantêm proteções mais amplas às plataformas, o Brasil caminha para um modelo próprio de responsabilização.

A mudança pode influenciar discussões similares em outros países da América Latina e criar precedentes para futuras regulamentações na região. Especialistas acompanham de perto como as empresas de tecnologia reagirão às novas exigências brasileiras.

O que vem por aí

O julgamento deve ser concluído com o voto de Kassio Nunes Marques, mas a maioria já está definida. Após a decisão final, o Congresso Nacional e órgãos reguladores terão que trabalhar na implementação prática das mudanças.

A decisão representa uma das maiores alterações na regulamentação da internet brasileira desde a aprovação do Marco Civil em 2014, modificando fundamentalmente a relação entre plataformas digitais, usuários e poder público no ambiente online.

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Fonte: https://itforum.com.br/noticias/fachin-moderacao-conteudo-pessima-marco-civil/