Milton Leite aponta “desconforto” e diz que vereadores podem não votar privatização da Sabesp

O presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil), disse que hoje não há votos suficientes na Casa para aprovar o projeto de lei municipal que autorizaria a privatização da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo). “A sensação, na Câmara, é de desconforto com o projeto. Hoje, nós não temos votos para aprová-lo. E, no desconforto, eu não voto,” afirmou o vereador.

Segundo Leite, Tarcísio tentará acelerar a tramitação na Câmara, “mas vai ter muita dificuldade, pois há resistência de vários lados”, avalia. “Os vereadores estão torcendo o nariz. Nós vamos entregar a Sabesp para quem? Não temos uma direção”, continua.  Apesar de ser favorável à “tese de privatização (da Sabesp)”, ele diz que discorda da forma como “o projeto está neste momento”.

Na entrevista concedida ao jornal O Globo, o presidente do Legislativo paulistano não estabeleceu uma agenda para tramitação da proposta e disse que seguirá o “calendário da realidade”.

Ele também questiona se o município vai continuar recebendo o porcentual de 7,5% da receita da Sabesp para investir em projetos ambientais se a empresa for privatizada, outro entrave para o aval dos vereadores. “Qual a vantagem então? Que motivo alguém tem para votar? Estamos com bastante dificuldade”, disse. “Eu não posso votar um projeto desse sem convocar audiência pública para discutir com a sociedade”, afirmou Leite.

Outro impasse levantado por ele é se um eventual comprador da Sabesp vai arcar com a responsabilidade do tratamento de esgoto que é despejado hoje nas represas Billings e Guarapiranga, consequência das moradias irregulares no entorno dessas reclusas. Outra proposta é que a empresa se comprometa com a construção de habitações.

Atualmente o texto está em análise na Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa e ainda deve passar por outras comissões e audiências públicas nos “quatro cantos da cidade”, segundo o vereador.

Em fevereiro último, o governador Tarcísio de Freitas chegou a afirmar que a Câmara Municipal havia “girado a chave da resistência” na questão da privatização da estatal. “Acho que a gente vai caminhar muito bem”, gabou-se. O governo tem trabalhado com a perspectiva de jogar as ações da empresa na Bolsa de Valores até agosto deste ano.

Em dezembro do ano passado, enquanto manifestantes eram expulsos de forma violenta dos corredores da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e com o plenário da Casa tomado por gás lacrimogêneo, deputados governistas aprovaram o projeto que autorizou o governo do Estado a dar início a privatização da companhia.

SÃO PAULO NA CONTRAMÃO

Obsessão manifestada desde a posse de Tarcísio em 2023, a privatização da empresa de água e saneamento de SP vai na contramão de movimentos internacionais. Nos últimos anos, países da Europa vêm reestatizando suas empresas de água e energia, em razão da ineficiência dos serviços operados por empresas privadas.

Todas as etapas do processo para ceder a Sabesp ao controle privado tem sido marcado por irregularidades, a começar pelo “estudo” de viabilidade da privatização. A empresa contratada para isso foi a Internacional Finance Corporation, credora da companhia, e braço do Banco Mundial.

“Esse contrato chamou muito a nossa atenção, primeiro porque foi feito sem licitação, foi uma contratação direta com essa consultoria que, aliás, também é a consultoria responsável por outros estudos, como o da concessão do transporte sobre trilhos”, denunciou o deputado estadual Guilherme Cortez (PSOL-SP) em entrevista ao HP em novembro de 2023.

“Em segundo lugar, por um valor exorbitante – e por uma contradição porque o contrato prevê dois pagamentos: se o estudo apontasse contra a privatização, a empresa receberia R$ 8 milhões, mas se ela fosse favorável à privatização da Sabesp, receberia consideravelmente mais: R$ 45 milhões”, apontou o parlamentar.

Outro problema envolvendo a proposta foi a celeridade com que o projeto tramitou na Alesp. Sem passar por comissões importantes que deveriam analisar o tema, foi instalado na casa um imbróglio chamado “congresso de comissões” , manobra que resultou na aprovação do texto do relator favorável à venda da estatal.

Deputados contrários ao projeto criticaram a falta de transparência e de debate com a sociedade para discutir a venda de uma empresa estratégica como a Sabesp e que entrega um serviço eficiente aos consumidores.

Dados do Censo 2022 divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em fevereiro deste ano mostram que o Estado de São Paulo é o que tem o melhor serviço de esgoto do país. Segundo o levantamento, 90,8% da população tem acesso ao sistema de coleta, enquanto a média nacional é 62,5%.

Após o aval dos governistas na Alesp, o prazo para leitura e contribuições da sociedade civil e dos 375 municípios atendidos pela estatal foi muito estreito: trintas dias apenas. “Documentos que somam perto de 25 mil páginas, são mais de 430 horas de leitura”, criticou o engenheiro Amauri Pollachi, conselheiro do Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (Ondas) e diretor de Relações Externas da APU (Associação dos Profissionais Universitários da Sabesp).

No Legislativo municipal também houve críticas à corrida para aprovar o texto enviado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB) à Casa favorável à privatização antes mesmo sem a Comissão de Estudos Relativos ao Processo de Privatização da Sabesp criada no Parlamento paulistano concluir os trabalhos. 

“Ainda não concluiu os seus estudos sobre o impacto da privatização da Sabesp e já tem um Projeto de Lei enviado para a Casa para autorizar o prefeito a mudar o contrato que nós temos com a Sabesp desde 2010”, disse o vereador Hélio Rodrigues (PT).

O post Milton Leite aponta “desconforto” e diz que vereadores podem não votar privatização da Sabesp apareceu primeiro em Hora do Povo.

Fonte: https://horadopovo.com.br/milton-leite-aponta-desconforto-e-diz-que-vereadores-podem-nao-votar-privatizacao-da-sabesp/